terça-feira, 16 de maio de 2006

‘Intelectual do crime’ comanda a desordem em SP
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Era fevereiro de 2002. A Penitenciária Augustino de Oliveira Jr., no município mineiro de Unaí, jamais recebera um prisioneiro tão recomendado. Viera de Brasília, distante 230 quilômetros, com a advertência de que deveria ser trancafiado numa solitária.

Além de um sobrenome inusual, o preso Marcos Willians Herbas Camacho (na foto) carregava uma bagagem atípica. Algumas peças, listadas num relatório policial, chamaram a atenção de autoridades judiciárias que se envolveram na operação de transferência do prisioneiro. Eram livros.

Os títulos indicavam um gosto editorial tão eclético quanto refinado: ‘Estação Carandiru’, do médico brasileiro Drauzio Varella; ‘Cai o Pano’, da romancista britânica Agatha Christie; e ‘A Arte da Guerra’, do filósofo chinês Sun Tzu.

O preso não esquentaria lugar em Unaí. Seria logo devolvido ao sistema carcerário de São Paulo, sua origem. Ali, Willian Herbas Camacho era conhecido não pelo nome, mas pelo apelido: Marcola, um expoente de uma das organizações criminosas mais bem-estruturas do país: o PCC (Primeiro Comando da Capital).

No final daquele mesmo ano de 2002, Marcola assumiria o comando do PCC. Ele prevaleceu sobre dois outros líderes da organização: José Márcio Felício, o Geleião, e César Augusto Roriz, o Cesinha.

Decorridos quatro anos, Marcola é o rosto escondido por trás da onda de violência que vira São Paulo de ponta-cabeça. Ele desafia as forças de segurança do Estado há 72 horas. Nesta segunda-feira, foi citado em reunião na sala do presidente Lula. Roda o mundo desde sexta-feira como personagem do noticiário de jornais e da TV.

Em contatos com dois promotores de Justiça e um delegado de São Paulo e com um juiz de Brasília, o blog descobriu detalhes da biografia de Marcola. Um dos promotores o definiu como “intelectual do crime”. Outro disse que se trata de uma pessoa “prepotente e inteligentíssima”.

Marcola fez carreira no crime. Em menino, batia carteiras e roubava toca-fitas de automóveis no centro de São Paulo. Virou freguês da Febem. Migrou para o assalto a mão armada e o roubo a bancos. E tornou-se hóspede do sistema carcerário paulista. Acumula penas que somam mais de 40 anos de reclusão.

Comanda o PCC desde a jaula, seu habitat durante mais da metade dos seus 38 anos de idade. Comunica-se com a rua por meio de celulares. No início do ano, foi fotografado por um companheiro de cela manuseando um telefone (veja foto ao lado e leia reportagem aqui). Serve-se também de uma rede de pombos-correios que inclui mulheres de presos, advogados e policiais corruptos.

Marcola casou-se com a advogada Ana Maria Olivatto. Em 2002, ela foi assassinada com dois tiros na nuca. O crime foi supostamente encomendado por Aurinete Félix da Silva, mulher de César Roriz, o Cesinha, um dos que disputaram com Marcola o comando do PCC. O assassino de Ana Maria, conhecido como Ceará, “subiu” por ordem de Marcola. No linguajar do PCC, fazer uma pessoa “subir” significa matá-la.

O ‘intelectual do crime’ tem o primeiro grau completo. Concluiu a 8ª série na cadeia. Gaba-se de ter lido dezenas de livros. É educado com os companheiros, implacável com os adversários e arrogante com autoridades públicas.

Transferido no último sábado para o presídio de Presidente Bernardes (SP), Marcola disse, ao chegar: “Aqui eu não fico”. Sobre a onda de desordem iniciada na véspera, afirmou: "Só há uma solução para isso acabar: Deixem a gente em paz". As frases foram reproduzidas por um agente pebnitenciário ao repórter Cristiano Machado (aqui, para assinantes da Folha).

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